quinta-feira, 2 de outubro de 2025

Goka no Sadame 五箇之定

 O conceito de 五箇之定 (Goka no Sadame) — literalmente "Os Cinco Princípios Determinados" — é um dos pilares filosófico-estratégicos da escola Kashima Shintō-ryū de Kenjutsu.

Ele representa cinco determinações essenciais para o combate e para a formação do praticante como guerreiro. Essas cinco diretrizes não são apenas técnicas, mas princípios de conduta e percepção que organizam a postura, o espírito e a mente no campo de batalha — e na vida.


🔹 Tradução literal:

  • 五 (Go) – Cinco

  • 箇 (Ka) – Contador formal (de princípios, itens importantes)

  • 之 (no) – Partícula de posse

  • 定 (Sadame) – Determinação, princípio, fundamento fixado


As Cinco Determinações — Goka no Sadame:

  1. Katsujin-ken (活人剣) – A Espada que dá vida

    O princípio de não matar desnecessariamente. O verdadeiro domínio da espada visa proteger a vida, não destruí-la.
    É o ideal da espada como instrumento de paz e autocontrole, não de destruição.

    Significado:

    A espada que, mesmo em situação de conflito, preserva a vida, age com compaixão e age no limite da necessidade.

    Profundidade:

    • Representa o ideal máximo da via marcial (Budō).

    • Lutar não por agressão ou vaidade, mas por justiça, proteção e equilíbrio.

    • Envolve o domínio técnico e espiritual necessário para neutralizar o adversário sem destruí-lo.

    • É um ideal próximo do "Ken Zen Ichi Nyo" (Espada e Zen em Unidade): agir sem ego.

    Exemplo prático:

    Desviar ou desarmar sem causar ferimento, ou conduzir a luta de forma que a morte se torne desnecessária.



  2. Setsunintō (殺人刀) – A Espada que tira a vida

    Reconhece que, se necessário, a espada deve ser usada com decisão letal. Esse princípio não glorifica a morte, mas afirma que, quando não há outra escolha, é preciso agir com precisão e sem hesitação.

    Significado:

    Quando inevitável, a espada deve cumprir sua função com precisão mortal. Essa decisão requer clareza moral e técnica perfeita.

    Profundidade:

    • Não é apologia da violência, mas o reconhecimento de que o guerreiro verdadeiro não hesita diante do inevitável.

    • É o limite entre o uso da força e o não agir.

    • A diferença entre o assassino e o guerreiro está na intenção, no momento e no controle.

    Reflexão:

    “Se você hesitar, será morto. Se agir com raiva, será corrompido. Se agir com lucidez, permanece puro mesmo diante da morte.”



  3. Ken-tai-ichi (剣体一) – Espada e corpo como um só

    Unidade entre mente, corpo e espada. Não há separação entre a técnica e o corpo do praticante — é o princípio da integração absoluta. A espada é uma extensão do ser.

    Significado:

    A união absoluta entre o corpo (tai) e a espada (ken), sem separação entre pensamento e ação.

    Profundidade:

    • A espada não é uma ferramenta externa, mas um prolongamento da intenção.

    • O praticante deve eliminar atritos mentais e interferências corporais para se tornar “um” com o momento e com a ação.

    • Relaciona-se ao conceito de "mushin" (mente vazia) — a ação sem obstrução.

    Aplicação:

    A técnica não deve parecer forçada. O corte surge como reflexo natural da unidade corpo-espada-intenção.


     

  4. Tai no Henka (体の変化) Transformação do corpo

    mais fiel às transmissões clássicas da Kashima Shintō-ryū e aparece em textos internos da escola. Ela traz "Tai no Henka" como o 4º princípio, enfatizando a transformação do corpo como estágio necessário antes da estabilização do coração.



    Fudōshin (不動心)
    – Coração imperturbável

    Estado mental de equilíbrio e serenidade, mesmo em situações de perigo ou caos. A mente que não vacila permite ações corretas e leitura clara do oponente.

    Significado:

    Estado mental de imperturbabilidade, em que o praticante não é afetado por medo, raiva, dúvida ou vaidade.

    Profundidade:

    • É o coração que não se agita com vitórias ou derrotas.

    • A serenidade permite percepção clara do movimento do oponente e ação precisa.

    • Está profundamente conectado ao Zen e à ideia de estabilidade do ser.

    Imagem simbólica:

    Um lago calmo reflete claramente o céu — assim é a mente de quem possui Fudōshin.


     

  5. Kokoro no kamae (心の構え) – A postura do coração

    Vai além da postura física. É a atitude interior, a disposição do espírito. Mostra que a verdadeira "guarda" é mental — a forma como enfrentamos o outro com compaixão, coragem e vigilância.

    Significado:

    A verdadeira “guarda” não é a física (espada alta ou baixa), mas a disposição interior de atenção, compaixão e firmeza.

    Profundidade:

    • A postura mais importante é a do coração preparado.

    • Inclui o estado de prontidão moral, a não arrogância e o respeito pelo oponente.

    • Um guerreiro pode estar tecnicamente pronto, mas se seu kokoro (coração/espírito) estiver desequilibrado, será derrotado.

    Interligação:

    Este princípio sustenta todos os outros quatro. Sem Kokoro no Kamae, não há Katsujinken, nem Fudōshin, nem Kenshi verdadeiro.


    Interpretação filosófica:

    O Goka no Sadame é mais do que uma lista de técnicas — é um mapa ético e mental para o guerreiro. Ensina:

    • Quando lutar e quando poupar,

    • Como se manter firme sem se tornar cruel,

    • E como desenvolver autodomínio espiritual através da espada.


    Em resumo

Princípio                 Significado                               Central Propósito Filosófico

Katsujinken                     A espada que salva vidas                                          Compaixão e proteção                                  

Satsujintō                           A espada que mata                                              Determinação clara diante da necessidade

Ken-tai-ichi                     Corpo e espada em unidade                                   Eliminação da separação entre mente e ação

Fudōshin                            Mente inabalável                                                  Serenidade em qualquer circunstância

Kokoro no Kamae             Postura interior, espírito em prontidão                  Atitude ética e vigilância moral                


 

Influência do Shintō e do Zen

A escola Kashima Shintō-ryū tem raízes tanto:

No Shintō (espiritualidade nativa japonesa) — com reverência à harmonia com os deuses (kami), à purificação e à ordem natural; quanto no Zen, com ênfase em mushin (mente vazia), fudōshin (espírito imóvel) e heijōshin (coração tranquilo).

O Goka no Sadame pode, portanto, ser lido como uma mandala marcial: cada princípio é uma pétala que leva ao centro — o despertar espiritual por meio do caminho da espada.




Conexão Espiritual

O Goka no Sadame também pode ser visto como um processo de purificação interior:

  • Ele orienta a superação do ego, do medo e da impulsividade.

  • Leva o praticante ao centro do Caminho marcial (Dō), onde ação e não-ação, vida e morte, espada e compaixão se harmonizam.


    A Conexão Espiritual do Goka no Sadame

    O Goka no Sadame não é apenas um conjunto técnico ou ético — ele forma um caminho de cultivo espiritual (shugyō 修行) que visa a transformação interior do praticante.

    Cada um dos cinco princípios é um degrau para a transcendência do ego e a integração com o fluxo da natureza, da vida e da morte. Vejamos:


    🔹 1. 活人剣 (Katsujinken) — A Espada que dá Vida

    • Espiritualmente, representa o despertar da compaixão universal (慈悲 – jihi).

    • O guerreiro deixa de agir por instinto ou interesse próprio, e passa a agir conforme os princípios do Céu e da Terra.

    • A espada torna-se um instrumento do Dharma (lei cósmica), e não da destruição.

    👉 É aqui que o guerreiro começa a perceber que o outro não é “inimigo”, mas um espelho de si mesmo.


    🔹 2. 殺人刀 (Satsujintō) — A Espada que tira a Vida

    • Espiritualmente, esse princípio confronta o praticante com a realidade da impermanência (無常 – mujō).

    • Ensina que a vida e a morte não são opostos, mas polaridades naturais.

    • O ato de cortar pode ser também o ato de libertar — inclusive a si mesmo, da ignorância ou da passividade.

    👉 Aqui, o guerreiro compreende que às vezes “matar” simboliza cortar a ilusão, o ego, o medo. É uma espada que transforma, não apenas destrói.


    🔹 3. 剣体一 (Ken-tai-ichi) — Espada e Corpo como Um Só

    • A unidade entre corpo e espada espelha a busca pela unidade entre o ser individual e o fluxo do Universo (道 – Dō).

    • O corpo deixa de ser apenas veículo de ação: torna-se canal da intenção pura, livre de dualidades.

    • Essa integração é também um estado meditativo, de presença total no agora.

    👉 É quando a espada se torna extensão do ki, e o gesto do corte é como o traço de um pincel caligráfico — expressão direta do espírito.


    🔹 4. 不動心 (Fudōshin) — Coração Inabalável

    • Representa o estado de equanimidade plena, como o coração de um Bodhisattva ou de um monge Zen em zazen.

    • O guerreiro torna-se centro imóvel em meio ao caos, imune às flutuações da mente reativa.

    • A espada que parte de Fudōshin não nasce da raiva, nem do medo, mas da clareza.

    👉 Aqui, a espada é como o trovão que segue o relâmpago da iluminação. Age no momento certo, sem hesitação nem arrependimento.

    Tai no Henka (体の変化) é frequentemente compreendido como a adaptabilidade física nas técnicas, mas no contexto espiritual do Goka no Sadame,

    Tai no Henka não é apenas uma adaptação física — é a via da elevação do praticante, a jornada que começa na carne e culmina no espírito.


    🔹 5. 心の構え (Kokoro no Kamae) — Postura do Coração

    • A guarda do espírito é a mais profunda de todas: é a atitude silenciosa, firme, humilde e vigilante.

    • Representa a disposição de se colocar constantemente sob o olhar da Verdade.

    • Essa postura espiritual é a base de todas as outras, pois sem ela não há clareza de intenção nem legitimidade na ação.

    👉 É quando o guerreiro percebe que sua maior batalha não é contra o inimigo externo, mas contra a própria vaidade, pressa, orgulho e ilusão.


A Jornada Espiritual por Trás dos Cinco Princípios:

EstágioPrincípioTransformação Espiritual
Início do Caminho                                         Katsujinken                              Despertar da compaixão e da consciência do outro
Enfrentamento do Abismo                              SatsujintōAceitação da morte e da impermanência
Integração Corpo-Espírito                            Ken-tai-ichi                              Unidade entre ação, intenção e ser                        
Transcendência do Ego                                    FudōshinPaz inabalável em meio ao conflito
Presença Espiritual                                    Kokoro no Kamae                        Vigilância constante e coração sem mácula         

quinta-feira, 25 de setembro de 2025

O sistema de artes marciais da escola Kashima Shin-ryū.


"Visão geral do estilo", a conclusão do Kashima Shinryu remonta ao Ichinotachi criado por Matsumoto Bizen-no-kami Ki Masamoto. Isso pode ser considerado a essência da esgrima, cristalizada sobre o equilíbrio uniforme de cada verdade (unidade de movimento e repouso, unidade de início e desenvolvimento, unidade de ataque e defesa, unidade de verdade e falsidade, unidade de yin e yang) do princípio básico conhecido como "Goka no Sadame". Além disso, a essência das artes marciais de Kashima Shinryu, que também introduziu o equilíbrio metafísico, pode ser vista no "Muso Ken" criado por Kunii Daizen Minamoto Kuryama, o 12º mestre da escola. Enquanto Ichinotachi é uma técnica que refina o Goka no Sadame à luz da "razão de Shinto", Muso Ken é uma técnica que refina o Goka no Sadame à luz do "assunto de Ki-atari". É o Kashima Shinryu que contém tais técnicas, que foram criadas sob inspiração e engenhosidade em busca do espírito de Shinbu, como parte do sistema de artes marciais, sem que se destaquem excessivamente.





Além disso, deve-se notar que, juntamente com os Cinco Artigos de Determinação como um princípio filosófico fundamental, o "quadrado, círculo, curva, reto e agudo" como um princípio físico fundamental também é um elemento importante do Kashima Shinryu. Pode-se dizer que é a lei básica para manipular todas as técnicas como movimento espiral. Na doutrina do Kashima Shinryu, que deve convergir para o "princípio da origem do universo" em última análise, as artes marciais também são vistas como um fenômeno natural sem começo nem fim que repete manifestação, redução e promoção. Tomando como exemplo a postura do Kashima Shinryu, é a forma de origem da técnica e, ao mesmo tempo, a forma final da técnica, sendo um estado estático que internaliza o movimento.








O atual Kashima Shinryu é uma ressublimação do "abraço e assimilação da espada de Takemikazuchi", que é o cerne do espírito do Deus Marcial japonês, no qual Yoshimi Kunii, o 18º Soke, revisou cada uma das técnicas transmitidas de geração em geração sob os Cinco Artigos do Código Legal, enquanto acumulava treinamento em artes marciais até os limites de sua capacidade. Este conteúdo de artes marciais foi preservado e herdado por Fumitake Seki, o 19º Soke, e então ensinado à próxima geração em uma forma adequada para a educação moderna. Uma característica do Kashima Shinryu Bujutsu é que é uma arte marcial abrangente. Todas as suas técnicas têm uma natureza de anverso e reverso, com o anverso sendo classificado em esgrima, espada de bolso, arte de desembainhar, arte do cajado, arte da alabarda, arte da lança, etc., e o reverso sendo classificado em jiu-jitsu, arte do bastão, etc. Mesmo ao usar o anverso, pode-se mudar para o reverso dependendo das mudanças na situação com o oponente. Como todas essas técnicas são incorporadas com os mesmos princípios básicos, uma vez que a proficiência em técnicas básicas é alcançada em esgrima e jiu-jitsu, torna-se possível manipular livremente uma ampla gama de técnicas, incluindo armas longas e como lidar com elas.


No treinamento de Kashima Shinryu, o kumijo para adquirir as técnicas de esgrima consiste em "Kihon Tachi", "Ura Tachi", "Aishin Kumi Tachi", "Jissen Tachi Kumi", "Kassen Tachi", "Tsubazeriai/Taobushi" e "Battōjutsu".


Kihon Tachi  基本太刀

Este é o kumitachi que se chamava "Hōjō no Kata" quando a linhagem da família Kashima Shinryu Soke reivindicava ser Jikishinkage-ryū. Houve uma época em que este kumitachi herdou as quatro técnicas que foram reorganizadas por Genshinsai Ogasawara, o quarto Soke, mas depois que Daizen Kunii, o décimo segundo Soke, reviveu o Kashima Shinryu com base no Tengu-sho, ele retornou ao original kumitachi de cinco técnicas e as usa para treinamento.

Kihon Tachi é um excelente kumijo projetado para dominar o "segredo da unidade da espada, da mente e do corpo", mas pode ser ensinado logo após a admissão. Ao praticar, uma espada de madeira é sempre usada como arma e o Kihon Tachi é sempre praticado, porque a base dos principais elementos técnicos para usar as técnicas de Kashima Shinryu está toda contida ali. Por isso, é rico em charme, pois mesmo após 10 ou 20 anos de treinamento, ainda permite a busca pelos mistérios ocultos ali.


Ura Tachi  裏太刀

Este é um treinamento em que as técnicas são usadas enquanto se aproximam e medem a distância um do outro. Ao aprender o kumijo de Ura Tachi, pode-se entender que Kashima Shinryu não é uma arte marcial para receber, mas sim para atacar primeiro. Isso é completamente diferente de uma estratégia de lidar com um ataque após recebê-lo.


Aishin Kumi Tachi 相心組太刀

O shitachi e o uchitachi usam técnicas em movimentos espirais enquanto lutam com as mesmas estratégias, e aprendem a pegar a vitória enquanto carregam o fluxo de ki que cada um emite nas técnicas da espada. Esta é uma kumitachi de alta patente que a família Kunii compilou e refinou em uma kumitachi, e transmitiu por centenas de anos, como a principal técnica que os samurais seniores praticavam como esgrima antes de Kashima Shinryu reivindicar um estilo ou nome.


Jissen Tachi Kumi 実戦太刀組

Este é um kumijo que consiste em 10 técnicas e é um treinamento de confronto em uma distância em que você pode cortar o oponente se der um passo à frente. O uchitachi usa uma técnica após o fato, percebendo o ki no momento em que o shitachi inicia a técnica. Em resposta a isso, o shitachi domina uma técnica reversa, tornando-se um kumijo como uma batalha real. Quando Kashima Shinryu espalhou as artes marciais para o Domínio Mito Tokugawa sob o nome de Shinkage-ryū, apenas este kumijo era usado para treinamento de kata.


Kassen Tachi 合戦太刀

Este é um kumijo compilado para adquirir técnicas adequadas para batalhas no campo de batalha. Pessoas vestidas com armaduras usam técnicas fechando a distância de uma distância suficiente. Você pode aprender como derrubar um oponente no campo de batalha atacando os pontos fracos de um oponente blindado e a diversidade de técnicas que foram concebidas aplicando racionalmente a mecânica.


Tsubazeriai/Taobushi  鍔競・倒打

Este é um kumijo onde você aprende como derrubar um oponente transferindo a luta de espadas para um tsubazeriai e derrubando o oponente, uma técnica usada por mestres que têm dificuldade em decidir uma partida em um kumitachi. Esta é uma técnica de usar jiu-jitsu enquanto segura uma espada.


Battōjutsu 抜刀術

Este é um kumijo para usar a esgrima com a espada embainhada como postura. Aprenda a sacar a espada enquanto se esquiva do ataque do uchitachi e controlar o ataque do uchitachi em um único movimento. Na fase inicial, o treinamento individual é realizado com um oponente em mente, mas o treinamento básico é usar técnicas combinando o fluxo de ki enquanto recebe o ataque do oponente.

Em Kashima Shinryu, diz-se que, uma vez que as técnicas de esgrima, que são estas técnicas de anverso, podem ser usadas em um nível equivalente a uma licença, as técnicas de jiu-jitsu e arte do bastão, que são técnicas de reverso, podem ser usadas livremente apenas acumulando um único dia de treinamento. Isso ocorre porque o trabalho de corpo da esgrima é a base de todo o trabalho de corpo de todas as 18 artes marciais de Kashima Shinryu. Ou seja, em Kashima Shinryu, até mesmo o trabalho de corpo do jiu-jitsu é basicamente o mesmo da esgrima.



No entanto, ao aplicar técnicas secretas, fatores mecânicos como diferenças de força física têm um grande impacto no resultado, por isso, a forma de emitir ki que aumenta a eficiência mecânica nas artes marciais e o movimento em espiral que domina as técnicas de arremesso em um único movimento são particularmente importantes. Para tornar este treinamento possível passo a passo, o Kumiwaza do Jujutsu é composto por "Reiki Nage", "I-dori", "Tachiwaza", "Nage Waza", "Gusoku Dori", etc.

Respiração de Ki (Reiki To) 霊気投

Embora não esteja explicitamente declarado como um sistema de técnicas, inclui os movimentos básicos do Kashima Shin-ryu que são comuns a todas as técnicas. É um treinamento básico para aprender a usar técnicas de jujutsu dinamicamente eficientes, unindo o fluxo de ki com o movimento do corpo. A origem desta técnica está descrita no Kojiki, na mitologia de "A Pacificação de Ashihara no Nakatsukuni 5 A Submissão de Takeminakata". É o trabalho de Takemikazuchi-no-o-no-kami de Kashima Daijingu, que jogou Takeminakata-no-kami de Suwa Daijingu para longe e o fez render, e os detalhes são descritos como "Quando Suwa Daijingu agarrou a mão de Kashima Daijingu, a mão se tornou um pilar de gelo e também se transformou na lâmina de uma espada. Quando Suwa Daijingu ficou assustado e recuou, Kashima Daijingu rapidamente agarrou a mão de Suwa Daijingu, esmagou-a e a jogou fora." Se você puder tocar o coração de Kashima Daijingu praticando esta técnica, não haverá sensação melhor.

Iai-zukuri (Iza-dori) 居捕

É um trabalho em dupla onde as técnicas são usadas em um estado de seiza (sentado formalmente) um em frente ao outro. Em uma postura sentada, o movimento da parte inferior do corpo é restrito, então você pode praticar movimentos corporais que omitem todos os movimentos desnecessários. Neste caso, você não tem escolha a não ser usar a técnica enquanto emite fortemente ki do tanden (área abaixo do umbigo), então é possível praticar com foco particular em usar técnicas de jujutsu unindo o fluxo de ki com o movimento do corpo.

Tachi-waza 立業

Quando você recebe vários ataques em uma postura de pé, você usa técnicas com movimentos corporais livres que acompanham a parte inferior do corpo, com base nas técnicas de Iai-zukuri. É um trabalho em dupla onde você ataca por conta própria, induz a técnica de contra-ataque do oponente e desencadeia uma técnica reversa, usando técnicas de ataque a técnicas reversas como uma unidade.

Nage-waza 投業

Técnicas com uma extensão espacial e temporal ainda maior surgem em relação ao Tachi-waza. É muito dinâmico na aparência e é um trabalho em dupla que sela os movimentos do oponente aplicando a ação mecanicamente mais eficiente em resposta ao ataque do oponente. É uma boa prática para dominar os princípios das artes marciais mostrados em "Goka no Hotei" e "Hoen Kyokushoku Ei".

Kumi-gyo Gusoku-dori 組業具足捕

É uma arte marcial onde guerreiros de armadura se aproximam e usam técnicas um contra o outro em um campo de batalha quando não têm mais armas. Faz você sentir fortemente a tradição antiga, como o Kassen-dachi da esgrima. Consiste em uma série de técnicas que aplicam efetivamente os princípios de alavancas e polias em movimentos restritos pela armadura.

Torite-gaeshi 捕手返

É estruturado assumindo uma ampla gama de opções como agarrar, socar e chutar como ataques do oponente. Também assume ataques quando alguém está brandindo uma adaga. Por outro lado, em relação à sua própria postura, assume-se que ambas as mãos não podem ser usadas livremente ou que obstáculos ao redor estão no caminho. Este trabalho em dupla, que está cheio de maneiras de lidar com várias situações e dicas, pode ter oportunidades de ser útil como autodefesa na sociedade moderna.

Ato-waza 後業

Engenhosidade para lidar com ataques por trás.

A prática segue as formas tradicionais de treinamento marcial e se concentra na aquisição de "formas" com imediaticidade. Em outras palavras, técnicas práticas são adquiridas realizando "prática de forma" com imediaticidade. Com isso, a "prática de forma" sem imediaticidade, que meramente traça e aprende a "forma" da técnica, é estritamente rejeitada.

quinta-feira, 18 de setembro de 2025

Olhando para o Primeiro Tratado de Miyamoto Musashi

Muitas pessoas conhecem o famoso tratado de Miyamoto Musashi, "Gorin no Sho" (五輪の書), ou comumente chamado de "Livro dos 5 Anéis" em inglês, escrito em 1645. No entanto, em 1641, ele compilou outro tratado anterior, chamado "Heihō Sanjūgō Kajō" (兵法三十五箇条), ou "35 Regras do Combate Marcial". Sendo um exímio artista marcial no manejo da espada, Musashi escreveu este tratado a pedido de Hosokawa Tadatoshi, que era senhor do Domínio de Kumamoto, Província de Higo (atual Prefeitura de Kumamoto). Acredita-se que sejam as primeiras gravações do que mais tarde seria o estilo criado por Musashi, o “Niten Ichi ryū” (二天一流), o Heihō Sanjūgō Kajō foi preservado no densho de uma escola de kenjutsu chamada “Enmei ryū ¹ “, que o próprio Musashi ajudou a iniciar.

Recentemente, enquanto revisava o exemplar do Gorin no Sho,  também dar uma olhada no Heihō Sanjūgō Kajō. Ao comparar ambas as documentações, há semelhanças e diferenças. Há quem considere o primeiro um "rascunho" do Gorin no Sho e o assinaria em favor da versão mais renomada. Algumas das razões para isso incluem as seguintes:

  • Gorin no Sho é uma documentação muito mais longa, com mais comentários filosóficos.
  • Gorin no Sho possui muito mais detalhes sobre a atuação do artista marcial e as técnicas relacionadas ao Niten Ichi ryu.
  • Enquanto o Gorin no Sho abrange diretamente o estilo Niten Ichi ryu criado por Musashi, o Heihō Sanjūgo Kajō, que é muito relacionado, tem mais associação com o Enmei ryu.

No entanto, acredito que essa seja uma visão prematura, especialmente se você não conhece a história por trás da primeira documentação e para qual público ela foi escrita. Sendo um tratado sobre técnicas fundamentais e avançadas que podem beneficiar um artista marcial, Heihō Sanjūgo Kajō seria útil para qualquer pessoa interessada nesta área, mesmo que seja apenas como um acréscimo à sua coleção.

Observando as semelhanças entre ambas as documentações, algumas das regras do Heihō Sanjūgo Kajō também estão incluídas no Gorin no Sho. No entanto, observe que a formulação e/ou a abordagem que as expressa diferem um pouco entre ambos. Além disso, embora mais antigo, o Heihō Sanjūgo Kajō contém algumas perspectivas interessantes de Musashi. Vamos avaliar isso com um trecho da regra nº 2. Apresentarei abaixo a versão japonesa, juntamente com minha tradução para o inglês.


② 兵法之道見立処之事   

此道大分之兵法,一身之兵法に至迄,皆以て同意なるべし。

今書付一身の兵法,たとへば心を大将とし,手足を臣下郎等と思ひ,胴体を歩卒土民となし,国を治め身を修る事,大小共に,兵法の道におなじ。

② Analisando o Caminho do Combate Marcial 

O caminho do combate marcial é sempre o mesmo, desde o sistema militarista usado para grandes exércitos até as habilidades de combate individualistas.

Neste texto, usarei habilidades de combate individualistas como exemplo para a comparação. Por exemplo, a cabeça (mente) equivale ao comandante, as mãos e os pés são como subordinados próximos, como vassalos. O tronco é como os soldados de infantaria. Se, por meio dessa ideia, se treina o corpo como se fosse conquistar um país, então o caminho do combate marcial é, sem dúvida, o mesmo em todos os níveis.


Esta é uma comparação geral da disciplina para as habilidades individualistas aprimoradas por um artista marcial, sendo a mesma necessária para um exército funcionar bem e ter sucesso. É interessante, pois pode explicar diretamente como a mentalidade e a abordagem ao combate marcial transitaram do campo de batalha para escaramuças individuais durante o período Edo. Observe que a regra nº 2 do Heihō Sanjūgo Kajō é considerada relacionada ao capítulo "Pergaminho da Terra" do Gorin no Sho, mas isso não significa que esta seja uma cópia direta das palavras de um texto para outro. Qualquer pessoa familiarizada com ambos notará que, embora Musashi faça referências à disciplina do artista marcial como sendo a mesma para todas as profissões naquele capítulo específico, ele faz essa comparação principalmente usando a carpintaria.

As regras a seguir são algumas que oferecem perspectivas novas e únicas da filosofia de Musashi. Isto é, pela forma como são formuladas, visto que definitivamente não se enquadram em nenhum dos capítulos encontrados em Gorin no Sho. Juntamente com o original em japonês e minha tradução para o inglês, darei continuidade à minha interpretação do significado por trás das regras a seguir, da melhor forma que eu entender. É claro que, sendo minha interpretação, isso não significa que seja 100% perfeita.


⑦ 間積りの事

間を積る様,他には色々在れ共,兵法に居付心在によって,今伝る処,別の心あるべからず。何れの道なりとも,其事になるれば,能知る物なり。大形は我太刀人にあたる程の時は,人の太刀も,我にあたらんと思ふべし。人を討んとすれば,我身を忘るゝ物也。能々工夫あるべし。

⑦ Criando espaço

Há muitos pontos a considerar, além da necessidade de estar presente no momento e ter presença de espírito, no que diz respeito a criar espaço ao seu redor. Para explicar isso claramente, aqui está: você não deve ter sua mente em outro lugar ou em outros assuntos. Como todos os caminhos, para alcançar isso, você precisa ter conhecimento. O objetivo aqui é atingir o oponente com sua espada. Para conseguir isso, é preciso ter a mente de não ser atingido nem mesmo pela espada de outra pessoa. Quando você tenta derrubar alguém, você precisa se esquecer de si mesmo. Isso requer conhecimento e muito treinamento.


Para isso, você controla espaço suficiente ao seu redor, permitindo espaço para desferir golpes, além de evitar os golpes do oponente. Ao partir para o ataque, você também deve se comprometer e não hesitar, pois isso deixará a porta aberta para a reação do oponente.


⑳ 弦をはづすと云事

足にても,心にても,はやくはづす物也。敵おもひよらざる処にて,能々はづるゝ物也。工夫在るべし。

⑳ Soltando a corda

Para conseguir isso, é preciso compreender tanto os seus pensamentos quanto os do seu oponente. Você se afasta da linha de ataque usando seu corpo, espada, pernas e mente. Você aprenderá como se esquivar com base nos pensamentos do seu oponente. Isso requer muito treinamento.


Esta regra se refere à capacidade de ler o que seu oponente está tentando fazer. Simplificando, você reage de acordo com cada ação do seu oponente se conseguir entender o que ele/ela está planejando em seguida.


㉖ 残心放心の事

残心放心は事により時にしたがふ物也。我太刀を取て,常は意のこゝろをはなち,心のこゝろをのこす物也。又敵を慥に打時は,心のこゝろをはなち,意のこゝろを残す。残心放心の見立,色々在物也。能々吟味すべし。

㉖ Libertando o Espírito Atento

Este é um método para permitir que as coisas sigam seu curso natural por algum tempo, com base na situação em questão. Com a espada em punho, nosso espírito atento é liberado como se as coisas estivessem normais, enquanto nossa mente permanece ativa. Ou, ao derrotar um inimigo em tempo hábil, você descansa sua mente, mantendo-se atento através da intenção. Há muitos pontos a serem considerados ao analisar isso. Há muita informação a ser aprendida com isso.


Nas artes marciais japonesas, uma habilidade fundamental bastante reiterada é o zanshin (残心), que pode ser interpretado como manter a atenção após o término de um conflito. A regra acima vai além disso, onde a pessoa relaxa mentalmente, mas permanece atenta por meio da intenção, ou vice-versa.


㉛ 扉のおしへと云事

とぼその身と云は,敵の身に付く時,我身のはゞを広くすぐにして,敵の太刀も,身もたちかくすやうに成て,敵と我身の間の透のなき様に付べし。又身をそばめる時は,いかにもうすく,すぐに成て,敵の胸へ,我肩をつよくあつべし。敵を突たをす身也。工夫有べし。

㉛ Ensinamentos da Porta

Trata-se de ser como um tobaso (戸臍 ou 枢, porta de vaivém), onde, ao se aproximar do oponente, você rapidamente se alarga. Isso cria uma distorção em relação à espada e ao corpo do inimigo. Isso faz com que tudo fique exposto no espaço entre você e seu oponente. Ou, você se afina o mais rápido possível enquanto impulsiona seu ombro em direção ao peito do oponente.


Musashi descreve como mudar a orientação do seu corpo e usa a imagem de uma porta articulada como exemplo. Em teoria, posicionar-se em frente ao seu oponente pode ser eficaz de várias maneiras, inclusive psicologicamente, pois dá a impressão de que você é um alvo maior. No entanto, se o inimigo atacar, você se vira para o lado para que o ataque passe, o que lhe permite desferir um contra-ataque.


Aqui concluímos nossa discussão sobre o primeiro tratado de Miyamoto Musashi. Embora o Gorin no Sho seja de fato o mais popular mundialmente, o Heihō Sanjūgo Kajō ainda é um conjunto de regras ativo usado em certas escolas marciais japonesas que seguem os ensinamentos de Musashi. Além disso, existem publicações sobre o assunto, bem como diversos sites que o abordam em detalhes no Japão. Embora seja uma leitura mais breve, recomendo aos que levam as artes marciais a sério a leitura do Heihō Sanjūgo Kajō, mesmo que seja apenas uma vez.


1) Também conhecido como Musashi Enmei ryu (武蔵円明流).